segunda-feira, 11 de abril de 2011

Alunos dos 2ºs anos

Reforma Luterana

O que hoje chamamos de Alemanha era, desde a Idade Média, parte do Sacro Império Romano Germânico. Criado no século 11 como uma extensão temporal do poder do papado, houve momentos em que o poder imperial entrou em choque com o papa, como na questão envolvendo as investiduras de bispos, no século 16. A vitória do papado nessa que ficou conhecida como a Querela das Investiduras aprofundou o poder político da Igreja na região.
Por outro lado, o poder enorme exercido pela Igreja tornava-a o local ideal para a venda de relíquias e indulgências. Empenhado na construção da Basílica de São Pedro, o papa Leão 10º (1513-1521) encarregou o dominicano John Tetzel de realizar uma maciça venda de indulgências por toda a Alemanha.
Foi contra isso que se voltou o duque Frederico da Saxônia, impedindo a entrada de Tetzel em seu território. A alegação para a proibição foi o fato de a Igreja ter feito um acordo com a família de banqueiros alemães, os Függer, no qual os banqueiros emprestavam à Igreja o dinheiro necessário em troca da garantia de metade da renda obtida com a venda de indulgências.


Martinho Lutero

Nesse conflito envolveu-se Martinho Lutero (1483-1546), monge agostiniano e professor de teologia na Universidade de Wittenberg, com o apoio de Frederico. Na verdade, as críticas de Lutero à prática da Igreja já eram antigas, encontrando nesse contexto o espaço certo para sua disseminação.
Em 1517, Lutero fixou na porta da catedral de sua cidade um documento intitulado "95 Teses Contra as Indulgências". Nele, não apenas Lutero criticava violentamente a prática da Igreja, denunciando que o dinheiro das indulgências era usado para financiar o luxo do clero e atacando seu desregramento, como também se opunha a dogmas da Igreja. Ao afirmar que as indulgências eram incorretas, pois o fiel se salva não pelos atos que pratica, mas pela fé, Lutero incorria numa negação à doutrina da Igreja, uma heresia do ponto de vista da Igreja Católica, expondo-se assim à ação da Inquisição.
Excomungado como herege em 1520 pelo papa, Lutero recusou-se também a se retratar na Dieta de Worms, convocada pelo imperador Carlos 5º (Carlos de Habsburgo) e composta por todos os nobres laicos e eclesiásticos do Sacro Império. Estes, por sua vez, tinham interesse em apoiar Lutero, interessados em livrar-se da autoridade papal e em limitar o poder do imperador, defensor do catolicismo. Foram os príncipes alemães e a alta nobreza que ocultaram Lutero num castelo da Saxônia, impedindo sua execução.


Guerras e revoltas

Durante os três anos em que ficou oculto, Lutero traduziu a Bíblia para o alemão, numa forma de tornar seu conhecimento mais difundido entre a população, de modo a provar o quanto a Igreja havia se afastado dos propósitos cristãos. Em sua maioria, os príncipes alemães declararam-se adeptos da nova religião proposta por Lutero. Vendo nisso uma clara ameaça a seu poder, o imperador Carlos 5º impôs o catolicismo como religião oficial do império. Os príncipes protestaram contra essa imposição (daí advindo o termo "protestante"), dando início a um longo processo de guerras de religião na Alemanha.
Por outro lado, além do apoio da nobreza, por razões políticas, as idéias de Lutero despertaram o apoio dos camponeses, vendo nos ataques à Igreja uma oportunidade de reduzirem o grau de profunda desigualdade e exploração a que estavam submetidos. Várias revoltas camponesas eclodiram na Alemanha, entre elas a principal, liderada por Thomas Müntzer.
Lutero voltou-se violentamente contra esses movimentos, posto que, dependente do apoio dos nobres, ele jamais poderia colocar-se ao lado de revoltas camponesas. Assim, Lutero defendeu a postura mais agressiva possível contra eles ("[...] É preciso estrangulá-los; é preciso matar o cão raivoso que se lança contra ti ou ele te matará."). A repressão aristocrática aos camponeses durou de 1524 a 1536 e produziu mais de cem mil mortos.

Mudanças

Já em 1527, Lutero, juntamente com Melanchton, elaborou a Confissão de Augsburgo, que estabelecia os princípios de sua doutrina. Por ela estabelecia-se: que as Escrituras Sagradas eram o único dogma da nova religião; a fé era vista como a única fonte da salvação; a livre interpretação da Bíblia passava a ser permitida; negava-se a transubstanciação (transformação do pão e do vinho no corpo e no sangue de Cristo, presente na fé católica) e a crença de que a presença de Cristo na Eucaristia era espiritual; adotava-se o alemão, e não mais do latim, como idioma nos cultos religiosos; a Igreja passava a ficar submetida ao Estado; e, finalmente, permaneciam apenas dois sacramentos: o batismo e a eucaristia.
Em 1555, a Dieta de Augsburgo permitiu que cada príncipe escolhesse a sua religião, que passaria a ser também a de seus súditos ("cujus regio ejus religio" - tal príncipe, sua religião). O luteranismo triunfara na Alemanha. Foi adotado também na Suécia, em 1527, e na Dinamarca e Noruega, em 1536, como forma de afirmação dos poderes reais contra a interferência de Roma.

Reforma Calvinista

Desde 1499, a Suíça havia obtido a independência em relação ao Sacro Império, estando dividida, politicamente, em cantões autônomos. Região rica, palco da ação de uma crescente burguesia, a Suíça, e particularmente a cidade de Genebra, acompanhou a penetração das idéias luteranas no país, trazidas por Ulrich Zwinglio, que receberam forte acolhida junto à burguesia local.
As idéias de Zwinglio já haviam gerado um violento conflito entre reformistas e católicos entre 1529 e 1531. Essa guerra civil fora encerrada com a Paz de Kappel, que dava autonomia religiosa aos vários cantões suíços.

João Calvino

Essa situação atraiu para as cidades suíças vários líderes reformistas perseguidos na Europa inteira. Entre eles, João Calvino (1509-1564), que, fugindo da perseguição aos protestantes na França, refugiou-se na cidade de Genebra. Já em 1536, Calvino publicou sua obra Instituição da Religião Cristã, na qual ele apresentava uma ruptura bem mais sensível com os dogmas católicos do que as idéias de Lutero e de Zwinglio.
Segundo a visão de Calvino, a salvação só se alcança através da fé, mas ela é concedida por Deus a alguns eleitos (predestinação), sendo que o homem é pecador por natureza. O culto foi ainda mais simplificado, resumindo-se a comentários bíblicos feitos por sacerdotes sem paramentos, em igrejas simples e despojadas de imagens. A exemplo do luteranismo, apenas o batismo e a eucaristia foram conservados, nesta última também se abandonando a idéia de transubstanciação.
Não apenas as concepções religiosas de Calvino iam diretamente ao encontro das aspirações da sociedade de Genebra, mas também a ética por ele preconizada. Podem ser citadas, nesse sentido, inúmeras passagens do próprio Calvino, como por exemplo: "Deus chama a cada um para uma vocação particular cujo objetivo é a glorificação dele mesmo. O comerciante que busca o lucro, pelas qualidades que o sucesso econômico exige: o trabalho, a sobriedade, a ordem, responde também o chamado de Deus, santificando de seu lado o mundo pelo esforço e sua ação é santa".

Huguenotes, puritanos e presbiterianos

Calvino foi amplamente aceito pela elite local. Guindado à condição de um líder religioso e político, Calvino, através das Ordenações Eclesiásticas, implantou leis rígidas, que davam à sua Igreja o controle total sobre a vida religiosa, moral e política dos cidadãos. A nova Igreja dividiu-se em fiéis, pastores e um conselho, o Consistório, que possuía amplos poderes.
Composto por três pastores e doze representantes da sociedade local, eleitos por um conselho municipal, o Consistório tinha poderes para regular cada aspecto do comportamento do cidadão, incluindo sua indumentária e as práticas sociais.
As idéias de Calvino difundiram-se rapidamente, muito mais do que as idéias luteranas, o que é outra mostra de sua consonância com a sociedade urbana em formação. Na França, os calvinistas foram chamados de huguenotes. Na Inglaterra, pelo tipo de comportamento preconizado pelos calvinistas, marcado pela seriedade, pela austeridade inclusive no vestir, pela dedicação fundamental ao trabalho, eles foram chamados de puritanos. Na Escócia, onde as idéias calvinistas foram introduzidas por John Knox, a Igreja calvinista foi organizada a partir de conselhos de pastores, os presbíteros, daí a designação de presbiterianos.

Reforma Anglicana

O aspecto político das reformas teve, na Inglaterra, sua manifestação mais evidente. O próprio fato de a reforma religiosa ter sido conduzida diretamente pelos reis ingleses serve como comprovador dessa visão.
A dinastia Tudor nasceu num quadro de fortalecimento do poder real na Inglaterra, após o esmagamento dos setores dissidentes da nobreza na Guerra das Duas Rosas. O primeiro rei Tudor, Henrique 7º, procurou consolidar esse poder, esbarrando, entretanto, no forte poder político e econômico exercido pela Igreja Católica no país.
Foi o seu filho, Henrique 8º, quem vislumbrou a oportunidade de se voltar contra esse poder. Em meio à crise provocada na Alemanha pelo movimento luterano, Henrique 8º aproveitou-se do momento favorável para estabelecer um confronto com o papado.
Uma questão política e dinástica

A razão ostensiva para esse confronto liga-se a uma questão política e dinástica. Casado com a nobre espanhola, Catarina de Aragão, Henrique 8º tivera com ela uma filha, Mary. Impossibilitada de ter outros filhos, Catarina criava uma situação potencialmente perigosa para a monarquia inglesa. Sem filhos homens (o trono inglês jamais fora ocupado até então por uma mulher), Henrique 8º alegava o risco de morrer sem um herdeiro, o que tornava o rei da Espanha e Imperador do Sacro Império, Carlos 5º, sobrinho de Catarina, um dos pretendentes ao trono inglês.
Alegando a imperiosa necessidade de um herdeiro, Henrique solicita ao papa a anulação de seu casamento com Catarina. Tratava-se de uma manobra obviamente destinada a criar um confronto. Henrique tinha plena consciência de que o papa jamais iria se indispor contra Carlos 5º, seu principal aliado na luta contra Lutero.
Ante a recusa papal, Henrique 8º anulou por conta própria seu casamento, desposando, em seguida, Ana Bolena. Excomungado pelo papa, Henrique 8º reagiu, em 1534, com o Ato de Supremacia, por meio do qual ele criou uma Igreja nacional chamada Igreja Anglicana ou Igreja da Inglaterra, da qual era o chefe. Confiscou ainda os bens do clero católico na Inglaterra, distribuindo-os especialmente entre a gentry, a camada de pequenos e médios proprietários rurais, o que lhe assegurou uma ampla base de apoio.
Henrique não fez mudanças no culto. Elas foram obra de seu filho, Eduardo 4º, que, em 1549, impôs o Livro de Orações Comuns, em inglês, e em 1553 suprimiu a missa e o celibato clerical.
A Reforma anglicana completou-se no reinado de Elizabeth I (1558-1603) com a Lei dos 39 Artigos (1563). Adotou-se o calvinismo como conteúdo doutrinário, mas manteve-se a forma católica, preservando-se a hierarquia episcopal e parte da liturgia.

Reforma Católica e a Contra-Reforma

A contínua expansão do protestantismo por toda Europa colocou a Igreja Católica em uma situação crítica. Impunha-se uma reforma para moralizar o clero e, ao mesmo tempo, desencadear o combate às novas religiões, classificadas como heresias.
O surgimento da Companhia de Jesus, em 1534, por obra de Ignácio de Loyola, revelou-se fundamental para a realização da Reforma católica. Os jesuítas, chamados de "soldados de Cristo", devotando uma cega obediência ao papa, encarregaram-se de organizar um concílio.

Inquisição

Enquanto aguardava a instalação do concílio, o papa Paulo 3º (1534-1549) tomou medidas para combater o protestantismo. Em 1542, a Inquisição (ou Tribunal do Santo Ofício) foi reativada. Dominada pelos dominicanos, ela conseguiu, utilizando de métodos violentíssimos, deter o avanço protestante na Itália, na Espanha e em Portugal. Nos países ibéricos, o apoio real foi fundamental para a derrota do protestantismo. E em 1543 foi elaborado o Index Librorum Prohibitorum, ou simplesmente Index, um catálogo que arrolava obras de leitura proibida aos católicos.

Concílio de Trento

O Concílio de Trento reuniu-se, finalmente, em 1545, durando até 1563. Foi ecumênico, ou seja, reuniu representantes de toda Igreja. Ele produziu uma Igreja reformada, embora os dogmas católicos não sofressem alteração: o princípio da salvação pelas boas obras foi confirmado; o culto à Virgem e aos santos foi reafirmado; a infalibilidade papal, o celibato clerical e a indissolubilidade do casamento foram mantidos.
Graças às pressões dos jesuítas, a autoridade papal foi reforçada. A disciplina do clero restabelecida: fixaram-se condições e idades mínimas para o exercício das funções eclesiásticas; o acúmulo de bispados e paróquias foi proibido, bem como a venda de indulgências. Criaram-se seminários para a formação dos eclesiásticos e foram elaborados um Catecismo e um Missal.
Com a Igreja revigorada, os católicos dedicaram-se à Contra-Reforma, com o sistemático combate às religiões protestantes. Internamente, a Inquisição encarregou-se de manter o controle sobre as populações católicas, perseguindo os heréticos e contendo a difusão das doutrinas protestantes.
Externamente, procurou-se reconquistar, por meio da educação, as áreas perdidas para o protestantismo. Pelo empenho dos jesuítas, vários colégios encarregados do ensino primário foram fundados na Europa. O resultado foi modesto. Após duas gerações, parte da Renânia, o sul dos Países Baixos e a Polônia haviam sido reconquistados.
O maior êxito da Contra-Reforma deu-se pela difusão do catolicismo entre os povos pagãos, por meio da catequese. Graças ao controle ibérico sobre a maioria da América, as massas indígenas foram convertidas, e os esforços, especialmente dos jesuítas, alcançaram na Ásia, a China e o Japão, embora com resultados modestos e passageiros.

Alunos do 1º H

Egito Antigo

Tema frequente dos meios de comunicação, o Egito é um país geralmente associado a descobertas arqueológicas da era anterior a Cristo. No imaginário do mundo atual, é o país das pirâmides, das múmias, da sedutora rainha Cleópatra e do caudaloso rio Nilo.
De fato, a civilização que se desenvolveu no Egito, numa antiguidade muito remota, é surpreendente no que se refere principalmente a seus aspectos culturais, incluindo-se aí a escrita (os chamados hieróglifos), a pintura, a escultura, a arquitetura e a mitologia.
Porém, para se compreender o desenvolvimento cultural do antigo Egito, é preciso conhecer também as condições sociais e econômicas em que ele ocorreu. Do mesmo modo, é necessário considerar também uma questão geográfica, pois, como disse Heródoto, "o Egito é uma dádiva do Nilo".
Hoje, no início do século 21, o Egito conta com mais de 70 milhões de habitantes, sendo o mais populoso dos países de cultura árabe. E, exatamente como na Antiguidade, a maioria de sua população está concentrada em apenas 4% do território, às margens do rio Nilo.
Por se localizar numa região desértica - o nordeste da África -, o Egito sempre teve a sua vida ligada às águas desse rio e aos seus períodos de cheia, durante os quais o solo das margens é fertilizado, tornando possível o desenvolvimento de uma agricultura capaz de sustentar enormes contingentes populacionais. Por esse motivo, na Antiguidade o Egito era conhecido como o "Celeiro do Oriente".
Nos últimos séculos do 5º milênio a. C., com o processo de desertificação do norte da África e a formação do deserto do Saara, as populações nômades e seminômades da região foram atraídas para as margens do rio Nilo. A ocupação da bacia do Nilo ocorreu a partir da migração sucessiva de tribos vindas das regiões da Líbia (a oeste), da Etiópia (a leste) e da Palestina (no Oriente Médio), que acabaram formando a população egípcia.

Unificação dos reinos do Egito

Essas populações fixaram-se em aldeias agrícolas, que aos poucos formaram pequenas cidades-Estado, chamadas nomos, administradas pelos nomarcas, a primeira elite egípcia.
Como a agricultura era difícil - tanto por causa do deserto, quanto por causa da sazonalidade do rio Nilo -, esses nomos acabaram se unindo com o passar do tempo (não se conhece a data precisa), dando origem a dois reinos: o do Norte (Baixo Egito) e o do Sul (Alto Egito).
De acordo com a tradição, o rei Menés teria unificado ambos os reinos por volta do ano 3.000 a.C., tornando-se o primeiro faraó (título do rei egípcio), ou como se dizia na época "o senhor das duas terras", inaugurando assim a primeira dinastia do Egito.
A unificação garantiu a centralização política e administrativa dos vários nomos egípcios, o que facilitou a organização eficaz do trabalho da sociedade nas obras públicas, para manter o controle das águas e a construção de sistemas de irrigação do solo, garantindo a ampliação da agricultura e da pecuária, levando ao crescimento das cidades.
A partir de então, os nomos passaram a ser unidades administrativas dentro do Egito, englobando várias cidades, e os nomarcas passaram a se subordinar diretamente ao faraó.
A civilização egípcia desenvolveu-se às margens do rio Nilo, ocupando uma faixa de terra cuja largura media entre 10 e 20 quilômetros e que se estendia por cerca de mil quilômetros. Era extremamente dependente do rio, tanto para a manutenção das atividades agrícolas e a pecuária, como para o transporte de mercadorias e comunicação entre as diversas cidades. Tão apropriada era a navegação entre as várias regiões banhadas pelo Nilo, que os egípcios não precisaram construir estradas.

Diques e reservatórios no rio Nilo

O controle das cheias do rio foi condição essencial para o desenvolvimento da civilização na região, pois o seu leito não era suficiente para conter as águas que corriam do interior da África em direção ao mar Mediterrâneo, inundando a região entre julho e setembro. Assim, às margens do Nilo foram construídos diques e reservatórios, a fim de reter as águas que seriam utilizadas - por meio de canais de irrigação - no tempo de escassez das chuvas para a agricultura, a pecuária e o consumo humano.
Com o retorno das águas ao leito do rio (entre dezembro e maio), ficava armazenado nas margens um precioso fertilizante, o húmus, que permitiu o surgimento de uma agricultura de alta produtividade. O húmus, um fertilizante natural de cor escura, era tão essencial aos egípcios, que esse povo chamava sua região de Kemet, "terra negra", em oposição às terras vizinhas, chamadas de Deshret, "terra vermelha", ou seja, o deserto.
Segundo os historiadores G. Moktar e J. Vercoutter, a "experiência logo ensinou os egípcios a desconfiar da inconstância do rio. Para compensar a escassez periódica, era necessário estocar cereais para alimentar a população e - mais importante ainda - garantir quantidade suficiente de sementes para a semeadura seguinte, quaisquer que fossem as circunstâncias.
"Esses estoques de reserva eram fornecidos pelo governo central, graças ao duplo celeiro real, que estocava cereais em armazéns distribuídos por todo o país. Limitando o consumo em períodos de abundância e estocando o máximo possível para se precaver contra cheias insuficientes ou excessivas, o governo central passou a controlar, por assim dizer, a ordem natural e veio a desempenhar um papel muito importante."

Excedente econômico

A alta produtividade agrícola e o controle populacional permitiram que houvesse disponibilidade de recursos e de mão de obra, o que viabilizou a construção das pirâmides e dos palácios, o desenvolvimento do artesanato, da ourivesaria e as guerras de expansão.
Ao contrário do que comumente se pensa, a mão de obra utilizada em tais obras gigantescas era de camponeses livres, não de escravos. Apesar de a escravidão existir no Egito, era em pequena escala. O Estado egípcio submetia a população a uma forma de exploração chamada de "corveia real" ou "servidão real", ou seja, apesar de os trabalhadores serem homens livres, deviam, de tempos em tempos, prestar trabalho gratuito nas obras estatais, como forma de tributo.
A produção agrícola era diversificada: trigo, cevada, ervilha, cebola, linho, tâmaras, diversas árvores frutíferas, além da pecuária (bois, ovelhas, porcos, cabras). Os egípcios desenvolveram também a caça e a pesca: a primeira realizada nos pântanos e no deserto e a segunda praticada no Nilo, nos reservatórios e canais de irrigação.

Artesanato e cultura

O artesanato era muito importante. Utilizaram o linho e o couro de animais, confeccionaram cerâmicas e durante largo tempo não houve separação entre agricultores e artesãos: como o ciclo agrícola era de seis meses (plantio e colheita), o restante do tempo era aproveitado nas atividades artesanais, na construção e conservação dos canais de irrigação e dos reservatórios e na construção das obras públicas.
O papiro era abundante às margens do Nilo. As fibras da planta foram usadas para fazer embarcações, redes e cordas, mas acabaram tendo enorme importância quando utilizadas como matéria-prima para fazer papel. De acordo com o historiador J. Yoyotte, o "cultivo intensivo do papiro provavelmente contribuiu para o desaparecimento dos pântanos - refúgio dos pássaros, crocodilos e hipopótamos que, na opinião dos próprios antigos, davam brilho à paisagem egípcia".
Realizada pelos escribas, a transcrição nos papiros de fatos da história, do dia a dia do governo e das questões religiosas acabou se transformando em importante fonte histórica para a reconstrução da civilização egípcia, depois que os arqueólogos modernos conseguiram decifrar os hieróglifos.

Divisão social do Egito Antigo

Nos 3 mil anos do Egito dos faraós, a estrutura social pouco se alterou. Na base estavam os escravos, quase todos de origem estrangeira e em número reduzido, mas principalmente os camponeses livres, a maioria da população, que viviam nas aldeias e tinham de pagar diversos tributos ao Estado e aos templos.
Havia uma camada intermediária representada pelos artesãos urbanos. A classe dominante era formada pelo faraó - adorado como um deus e exercendo também o poder militar, civil e judiciário - e sua família, pelos sacerdotes, militares e altos funcionários do Estado, dentre eles os escribas e os nomarcas.
De acordo com o filósofo e historiador das religiões Mircea Eliade, para os egípcios a ordem social representava um aspecto da ordem cósmica. Assim, a realeza existiria desde o começo do mundo, pois o "Criador foi o primeiro Rei; ele transmitiu esta função ao filho e sucessor, o primeiro Faraó. Essa delegação consagrou a realeza como instituição divina".

Três impérios

A história política do Egito se divide em três grandes blocos chamados de Impérios, separados por períodos de crise, chamados de Períodos Intermediários.
O primeiro é o Antigo Império, caracterizado pela edificação das grandes pirâmides (as de Guisé), pelo crescimento da produtividade agrícola, pelo desenvolvimento das grandes construções (templos e palácios) e da ciência (matemática, medicina). Apesar da prosperidade, não houve ampliação do território, excetuando-se uma expedição ao sul, que conquistou parte da Núbia, reino que também vivia às margens Nilo.
São desconhecidas as razões que levaram ao fim do poder central por quase 50 anos, mas sabemos que ocorreram períodos de fome, provavelmente vinculados à diminuição das cheias do Nilo. Devem também ter ocorrido revoltas de camponeses contra o pagamento de tributos ao Estado.
Em torno de 2100 a.C., foi restabelecido o poder central: é o período do Médio Império. Ampliou-se a autoridade do Estado, aumentou a produção agrícola e foram construídas diversas obras de irrigação.
Por volta de 1640 a.C., o Egito foi conquistado pelos hicsos - povo de origem asiática -, que permaneceram 90 anos dominando a região. Era um povo guerreiro, hábil no uso de cavalos e do carro de guerra. Os hicsos trouxeram diversas inovações, principalmente no que se refere ao uso do bronze, que era desconhecido dos egípcios.
O período mais importante e mais conhecido do Egito Antigo é o Novo Império (1550-1076 a.C.). Foi o momento da expansão para a Ásia e da conquista da Palestina, Síria e Fenícia, chegando até o rio Eufrates, na Mesopotâmia.
Controlando o corredor sírio-palestino, criou-se um obstáculo às invasões dos povos asiáticos, que usava essa passagem para invadir o Egito pelo istmo de Suez. Isso facilitou o controle das rotas comerciais que passavam pela região e ampliou a cobrança de tributos.
A criação de um império na Ásia levou à formação de um exército permanente, em grande parte formado por mercenários líbios e núbios, e à utilização de novas armas, como a espada e os carros de guerra.

Esplendor e declínio do Império Egípcio

Durante o Novo Império intensificou-se o comércio externo com as ilhas de Creta e Chipre, no mar Mediterrâneo, e com a Fenícia; ampliou-se a máquina burocrática do Estado; e foram edificadas novas pirâmides e palácios, em grande parte com os recursos espoliados dos povos dominados. Somente Thutmés 3º (1469-1436), em uma de suas 17 expedições militares, trouxe como butins de guerra centenas de prisioneiros, 924 carros, 2.238 cavalos, 44 mil cabeças de gado e 200 quilos de ouro.
Os faraós tiveram enormes dificuldades em manter as conquistas na Ásia e o domínio da Núbia. Ocorreram rebeliões dentro do império, pressões nas fronteiras de povos atraídos pela riqueza do Egito e problemas internos devido ao crescimento da população (o aumento do número de habitantes por quilômetro quadrado gerou períodos de fome).
No século 7 a.C., Assurbanipal, rei dos assírios (povo da Mesopotâmia), ocupou o Egito, mas logo foi expulso. A invasão, porém, foi uma demonstração da fraqueza interna do império, apesar das reformas realizadas no Renascimento Saita (séculos 7 a 6 a.C.).
Ainda na Antiguidade, no século 6 a.C., o Egito perdeu a independência. Em 525 a.C., Cambises, imperador da Pérsia, invadiu e ocupou o Egito, que se manteve como satrapia persa por 200 anos. Os persas introduziram o camelo, que se adaptou bem à região e possibilitou o contato mais frequente com os oásis a oeste do rio Nilo.
Em 332 a.C., Alexandre Magno, da Macedônia, que já tinha conquistado a Grécia, a Ásia Menor, a Palestina e a Fenícia, também ocupou o Egito. Vinte e oito anos depois, seus herdeiros deram origem à dinastia dos Ptolomeus ou Período Ptolomaico, que se estendeu até 30 a.C., quando os romanos invadiram e ocuparam o Egito.



O papel da religião

A vida dos egípcios estava marcada pela religião e seus deuses. Segundo a mitologia egípcia, o deus Osíris ensinou a agricultura aos seres humanos, mas acabou traído e morto pelo irmão e rival Seth. Ísis, sua mulher, convenceu os outros deuses a trazer de volta Osíris para a Terra: era ele que julgava os egípcios depois que estes morriam; ouvia a defesa de cada um e, depois de pesar o coração do indivíduo - para saber se estava mentindo ou não -, decidia pela sua inocência ou culpa.
A crença em uma vida após a morte acompanhava o egípcio durante toda a sua existência. Dessa forma, a construção de grandes túmulos, onde estavam acumulados tesouros e objetos de uso pessoal do morto, servia para que, depois da vida, ele mantivesse a mesma condição material.
Segundo o egiptólogo A. Abu Bakr, "a crença no além foi sem dúvida favorecida e influenciada pelas condições geográficas do Egito, onde a aridez do solo e o clima quente asseguravam uma notável conservação dos corpos após a morte, o que deve ter estimulado fortemente a convicção de que a vida continuava no além-túmulo".
O politeísmo da religião egípcia foi brevemente interrompido pela instituição do monoteísmo pelo faraó Amenófis 4º (1380-1362 a.C.), que mudou seu nome para Akenaton e divulgou o culto ao deus Aton. Além de razões religiosas, o faraó também pretendia diminuir os poderes do clero, enriquecido pelo pagamento de tributos, e que exercia enorme influência política.
Akenaton fundou uma nova capital, perseguiu os sacerdotes inimigos de sua reforma, mas não conseguiu obter apoio popular. Após a sua morte foi restabelecido o politeísmo e a capital retornou para Tebas.

Mesopotâmia

Na Alta Mesopotâmia, região ocupada por uma das chamadas Civilizações Hidráulicas, as cheias dos rios Tigre e Eufrates ocorriam entre os meses de abril e maio, quando as geleiras das montanhas da Armênia derretiam e chegava a temporada das chuvas. Registros da época descrevem alagamentos que cobriam o solo "até onde os olhos não alcançam", muitas vezes destruindo tudo ao redor.
As técnicas para controlar tais cheias se desenvolveram ao mesmo tempo em que a civilização chegou aos povos mesopotâmicos. O trabalho árduo, de todos os membros das aldeias, possibilitou a construção de obras hidráulicas, como muros de contenção, diques, canais de irrigação e poços de armazenamento de água para o período da seca.
E exatamente por que esses trabalhos exigiam grande quantidade de pessoas em atividade constante (limpando, reformando, ampliando) e um bom planejamento, surgiram, por volta de 3.700 a.C, Estados centralizadores, que coordenavam tais tarefas.


Estados teocráticos

Especialistas na história da Mesopotâmia acreditam que os primeiros líderes políticos dessas cidades eram escolhidos por uma assembléia de cidadãos, já que a população que as habitava era pequena e cada família oferecia todos os seus membros aptos para as exaustivas tarefas nas obras de irrigação.
A elite privilegiada era formada por sacerdotes que, a fim de aplacar a fúria dos deuses e impedir novos e graves alagamentos, arrebanhavam mão-de-obra para a construção de templos que serviam para o culto religioso e, também, como celeiro para o excedente de produção a ser oferecido ao panteão de divindades. Na prática, contudo, os grãos sustentavam os sacerdotes, representantes dos deuses na terra. Aos poucos, os reis foram sendo associados a essa elite religiosa, surgindo os Estados teocráticos.

Economia e surgimento da escrita

A agricultura floresceu às margens do Tigre e do Eufrates. A base da alimentação era composta por cereais, principalmente a cevada e, em segundo plano, o trigo. O linho e o algodão também eram plantados. Com as obras hidráulicas, o excedente agrícola possibilitava o sustento dos reis, de suas famílias e de um número cada vez maior de funcionários públicos.
O comércio, à base de troca, também prosperou, pois a Mesopotâmia era (e ainda é) muito pobre em metais, pedras preciosas ou semipreciosas e madeira. Quanto mais a produção agrícola aumentava, mais os reis tinham condições de ir buscar em terras distantes produtos para ampliar a produtividade e ostentar seu poder.
Além da agricultura, povos nômades viviam da criação do gado miúdo (cabras, ovelhas, porcos), o que complementava a alimentação e o comércio das cidades. Daí, também, ser necessária a contabilidade da receita que se ampliava. A escrita se desenvolveu, portanto, para controlar a produtividade. As primeiras plaquetas de argila que contêm a escrita cuneiforme demonstram claramente essa importância. E tais plaquetas estão entre as mais antigas formas de escrita do homem.

Invasões e guerras

Porém, todo esse desenvolvimento trouxe sérios problemas para essas primeiras cidades: a rivalidade pelas terras mais férteis e a cobiça dos povos vizinhos. Ao contrário de outra civilização que se desenvolvia ao mesmo tempo, o Egito, as condições geográficas da Mesopotâmia não ofereciam proteção natural, o que ocasionou várias ondas de ataques, principalmente de povos vindos do leste.
Os mesopotâmicos tiveram que se armar. As lutas eram constantes, tanto entre as cidades, quanto contra os saqueadores e conquistadores externos. Os líderes políticos transformaram-se em líderes militares e, pela primeira vez na história, um exército regular passou a ser mantido pelo Estado.
Segundo John Keegan, especialista em história militar, não foi o desenvolvimento técnico que fez os exércitos mesopotâmicos serem temidos, mas seu poder de organização, o que prova, mais uma vez, a capacidade de mobilização e de planejamento de suas cidades. Os registros mostram que, por volta de 2.500 a.C., as batalhas eram comuns na região. Elmos e armaduras (ainda muito primitivas) foram encontrados em vários sítios arqueológicos.
No que diz respeito à arte da guerra, a Mesopotâmia tem uma vantagem geológica, pois possui uma reserva de estanho considerável. O estanho misturado ao cobre produz o bronze, metal muito mais duro do que o cobre, utilizado por muitos de seus inimigos.

Os assírios

Dentre os povos que governaram o vale dos rios Tigre e Eufrates, em se tratando da arte militar, os assírios se destacam. Povo rude, acostumado aos rigores do clima desértico, aprenderam rapidamente - com as tribos das estepes asiáticas - a usar o cavalo como arma de guerra, tornando-se aurigas temidos.
O carro de guerra possibilitava dupla vantagem: a força animal, de ataque e locomoção, e a carroça (aperfeiçoada sobre duas rodas), que podia levar o condutor do animal e mais um arqueiro. Ao usarem seus carros de guerra (bigas) para conquistar a Mesopotâmia, não encontraram muita dificuldade, já que as infantarias das cidades quase nada podiam fazer para deter a força conjunta do cavalo e do arqueiro. Dessa forma, os assírios conseguiram dominar a Mesopotâmia e estender suas fronteiras para muito além do vale de seus rios.
Mesmo assim, apesar de suas proezas tecnológicas, culturais e militares, marcos na evolução do homem, os povos da Mesopotâmia acabaram vencidos e conquistados pelos persas, uma civilização que tinha suas bases político-econômicas na expansão territorial.